Luquinhas

Janaíne Paiva
7 min readJun 12, 2023

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A gente se conheceu no lugar errado, na hora errada. Era eu com outro cara, dando carona pros amigos dele até o metrô. Ele era um dos amigos. Aí a gente se encontrou de novo um tempo depois, ele completamente poucas ideias, cara fechada, deitado no chão do meu apartamento mexendo no celular e eu dona da casa perguntando “por que você tá bravo?”, ele respondendo “ué, não tem som…”

Uai gata, se não tem som, você quer que ele esteja feliz com o que?

After vai, after vem, eu recebi um bom número de pessoas em casa esse dia, por uma boa quantidade de horas (desculpa, Phe!) e ele acabou sendo o último convidado que restou. Quem recebe gente em casa sabe que a hora que todo mundo vai embora e você sobra ali sozinho, costuma te inundar uma sensação de satisfação, mas também um vazio existencial com o cenário pós apocalíptico que está não só do lado de fora, como também toma conta do seu corpo inteiro.

Eis que nesse dia ele sobrou ali comigo. Diferente de tantos outros dias que eu ficava ali sozinha. Coloquei um set chillout super natureba preto e branco que eu amo de paixão do Nicola Cruz em Tulum e ficamos conversando.

Obviamente 2 amoebas não fazem muita coisa acontecer, a gente precisou entregar no carisma, na disruptura, a gente teve que transcender na mente.

Rir e zoar, assuntar e discutir.

E aí foi fácil, foi bão. Não teve personagem, jogo, azar. Não teve pensamento paralelo, só dois parsa conversando, tirando um lero, no téti a téti. Deitadinhos no edredom? Sim. Mas com muito respeito, nada demais.

Deve ser assim nos grandes romances da história. Tudo é mágico, até o que não é. Pedimos uma pizza na intenção de sobreviver, eu bolonhesa, ele portuguesa, igualmente enojados pela escolha um do outro, sem problemas, a gente só queria comer. E aí ele partiu.

Fiquei sem entender, juro, esse cara… queria me comer? Fiquei achando interessante a dúvida, tipo.. foi legal, mas não teve moove, então, não sei.

Como a vida não dá o que você quer e sim o que você precisa, eu comecei a namorar um outro conhecido dele, que nem era aquele primeiro lá. Vai ver era só preu entender que depois de um tempo parada já era capaz de me apaixonar de novo. Ou pra poder aprender a brigar. Sei lá, alguma lição deveria ter naquilo lá.

Eu juro que aprendi. Depois dessa preparação forçada a gente se encontrou de novo, mas aí só pra zoar. Ele de lá e eu de cá. Cada um na sua rota de caça. Se ele era Top Gun, eu era Máquina Mortífera. Dois protagonistas dos seus próprios filmes de ação e pornografia. Ninguém queria namorar.

Imagina! Minhas amigas falavam “vai namorar o Luquinhas, vai namorar o Luquinhas!” e eu “cala a boca, doida”.

Uma vez encontrei com ele num posto de gasolina, sem nenhum conhecido em volta, a gente prestes a subir pra transar e quando fui cumprimentar, pra dar um selinho, ele virou a cara, respondendo “cê é minha namorada agora?” e eu passada! Não era, ia só beijar.

Não lembro exatamente quando que me apaixonei. Uma vez uma amiga disse que leu em algum lugar que a paixão é como um tropeço.

De repente. Quando vê, já tá.

E comigo foi mesmo. Um belo dia pós after, ele num e eu em outro, combinamos de nos encontrar, jantei fora e pedi um pra viagem pra ele jantar também. Acho que foi ali que a gente entendeu o cuidado natural das coisas. Eu pensando nele e ele pensando como aquele spaguetti a bolonhesa era sensacional.

Vinha do meu restaurante preferido, Lollita, que fechou na pandemia e hoje eu sou tão grata de tudo ter começado lá, porque agora a gente sempre vai lembrar. Tinha um pf incrível e atendimento exemplar.

A gente sempre conversava. Até demais. Eu pedia pra ele vir sentar mais perto, ele ficava lá. Ser tratado como um pedaço de carne? Jamais. Não era muito do que eu costumava praticar.

Era tudo a nosso favor. O mistério, o proibido, a discrição. Ele um folgado, eu nada orgulhosa, a gente só queria se divertir mesmo, eu juro! Ele pode testemunhar!

Aí ele sumiu. Não aceitava mais meus convites, não aparecia mais na mesma frequência. Eu falei, quer saber? E encontrei uns 3 maluco pra me fazer pensar, “puts”.

Puts, é aquele lá. Aquele lá que me beija como se tivesse nadando no mar. Aquele lá que segura meu rosto com as duas mãos como se fosse um ator de malhação. Aquele lá que eu descobri que bunda dura me dava tesão. É, parece que a gente vai lá fora só pra descobrir que aqui dentro tá bão.

Ele que pega nos meus peitos como se fosse uma taça de martini delicada que pode quebrar, pra ele que contei o meu ponto secreto pra me excitar, que eu desabafei tudo o que já me fez chorar.

Ele entendeu tudo de um jeitinho tão inédito. Tão puro. É inacreditável mesmo esse tipo de coisa.

Enquanto ele dormia ao meu lado eu pesquisava: “Quanto tempo pode durar uma paixão?” e o site dizia no máximo dois anos. Posso dizer que é amor então.

No primeiro ano a gente só zuava e fazia juras de amor. Transava na cozinha, viajava pra ver o mar. Eu ia embora do país por tempo indeterminado mesmo, então não tinha pressão, não tinha que rotular. Era isso hoje e só Deus sabe o amanhã.

Mas o amanhã chegava e a gente continuava lá.

É lógico que nem tudo são flores, que já tentaram nos separar, até mesmo a gente já chegou a se perguntar, “quer terminar?”. Já acharam que a gente era só mais um e a gente continuou lá. Quem iria imaginar?

Mas quando eu ganhei meu primeiro Oscar ele foi a primeira pessoa que eu quis contar. Aí ele perguntou “mas Oscar de quê?” e eu fiquei sem saber o que responder. Daí quando ganhei meu segundo já vim com a resposta pronta “direção”.

Eu amo quando a gente tá indo dormir e eu começo meu show de comédia deitados e ele fala “você é muito idiota, pelo amor de Deus, cala a boca”. Como aquela vez que eu disse que era tipo uma batata ao contrário, porque meu corpo estrala sozinho quando eu me mexo, eu sou macia por fora e crocante por dentro, logo eu sou uma tataba.

Sabe essas coisas? Que você pode ser você mesmo perto de alguém? Eu sei que ele se sentia assim também porque muito cedo ele já peidava perto de mim e me dizia que segurar faz mal.

Eu amo que a gente se assumiu no aniversário da mãe dele e ela tava lá toda jovem de vestididinho e tênis no pé. Foi quando eu descobri que os dois têm pavor de barata. Enquanto eu fumava um narguile com a melhor amiga dela.

É tanta coisa que eu acho maravilhosa que quase nem lembro das partes escrotas que a gente já passou. Do tanto de chilique que eu já dei, das aceleradas no carro, das sextas feiras que mudou de planos, das meninas feias que ele já beijou, das vezes que ele me mandava calar a boca e eu falava “vem fazer”.

Eu prefiro lembrar de quando eu tava sozinha em outro país e a vó mandou cem reais pra me ajudar. De quando o papai pergunta se eu quero pipoca e não faz só porque você pediu. De quando eu fiquei bêbada e contei que não gostava mais da minha mãe e todo mundo respeitou. De quando a gente ficava na sala vendo filme e tomando toddynho, enquanto o papagaio grita “Vai Corinthians!” da cozinha.

Gosto de lembrar de todas as vezes que fui emocionada com alguma cilada e ele olhou pra mim de canto de olho bem sério (igual no dia do after na minha casa) e falou “calma, você tá emocionada” e tava certo, eu tava emocionada mesmo.

Gosto de lembrar da primeira vez que tava certo numa briga e ficou feliz demais, a ponto de conseguir ficar errado de novo.

Gosto ainda mais de lembrar que a gente tomava banho junto no banheiro da menina hippie que eu morava e fingia ser o próprio casal da Lagoa Azul só que num box com a luz rosa, um monte de pedra colorida e sabonete Phebo.

Amo que ele me ensinou a beijar e eu ensinei ele que mamar dedão do pé é gostoso sim.

Eu nunca conto pra ninguém mas quando eu visito o futuro ele sempre está lá. E cada vez que eu espio é sempre mais incrível que o presente então eu deixo tudo rolar.

Todo dia é uma escolha, a gente tem que querer ficar. Não é nada fácil, né, tem muito o que conversar, alinhar, abraçar, beijar, transar, gritar, chorar, surtar, sonhar. Tem muito pra gente viver, decidir, realizar.

É realmente uma parceria ímpar que nunca imaginei viver, nem achava que essas coisas eram verdade. Achava que amor de filme só ficava em filme, que relacionamentos leves e felizes eram imaginação de gente romântica sem ter o que fazer.

Que a vida era amarga e que eu jamais seria feliz.

Aí ele apareceu e olha eu aqui.

Quem me vê a 2km de distância sabe que eu estou feliz. Quem me ouve 10 minutos sabe que ele existe. Quem enxerga minha confiança na vida, sabe que eu tenho prazer em estar aqui.

Eu não cheguei aqui sozinha, boa parte disso é graças a ele me amar assim. Me deixar ser. A gente sabe que as vezes as pessoas se encaixam em relacionamentos e pra isso elas se fazem caber. A gente fez o relacionamento caber na gente. E por isso eu agradeço. Todo dia. Obrigada, Luquinhas, por me deixar ser eu mesma e me amar mesmo assim.

Por me dizer “ontem eu num falei que te amava? por que você acha que hoje mudou?”.

Obrigada por ser minha vida e meu tudão. Sorte a minha de ter encontrado você. Que a gente mereça essa relação e tudo mais que surgir daqui.

Obrigada também aos nossos amigos por acompanharem a gente nessa aventura de pertinho com muita zoeira e bom humor, cada um segurando nossas mãos pra gente nunca deixar de ser um eu sozinho que quer estar junto um do outro.

Eu amo ser sua namorada.

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